23 | maio | 2017
MULHER PIONEIRA: Sarita Junqueira Rodas eleita a primeira conselheira do Fundecitrus
Confira na íntegra o perfil de Sarita Rodas – Grupo Junqueira Rodas – publicado na edição 39 da revista Citricultor
A primeira mulher eleita para o Conselho Deliberativo do Fundecitrus é o exemplo de que o agronegócio e a citricultura estão se adaptando aos novos tempos. Sarita Junqueira Rodas, de 33 anos, presidente do Conselho do Grupo Junqueira Rodas, de Monte Azul Paulista, foi eleita membro do grupo que gere o Fundecitrus, em setembro, se tornando a primeira presença feminina – e também a mais nova – no Conselho.
Ser precursora não é novidade para Sarita. Também é a primeira e única mulher no Conselho de Administração da Montecitrus, importante grupo de produção e comercialização de laranja do estado de São Paulo. Caçula de três irmãs, aceitou a responsabilidade de tocar os negócios da família, ao lado da mãe, Maria Teresa Junqueira Rodas, após o pai, Fábio Rodas, reconhecido citricultor da região de Monte Azul, morrer inesperadamente, em agosto de 2008, quando ela tinha apenas 25 anos. Seis meses antes, havia perdido a irmã mais velha.
“Comecei nos negócios da família fazendo um trainee para acionistas, dentro de um plano de governança familiar. Fiz esse trabalho por seis meses e, infelizmente, no final desse período, meu pai faleceu. A gente teve que, junto com a equipe, se organizar e assumir os negócios. Para o acionista trabalhar na empresa tem que ter vários pré-requisitos porque tem que ser escolhido pela competência e não pela hierarquia e fui me preparar. Houve uma administração de transição até que eu continuasse os treinamentos, me aperfeiçoei em governança familiar, terminei a faculdade de Direito e continuei na empresa com trabalho de aperfeiçoamento voluntariado até que, em 2013, me tornei funcionária oficialmente”, conta.
Desde então, Sarita comanda o que chama de 'legado do pai'. “O grande trabalho foi feito por ele e a nós cabe continuar”, diz. O grupo Junqueira Rodas surgiu em 1991, após a divisão da gestão da parte agrícola do Grupo Rodas, dos irmãos, Fábio, Paulo e Wanderlei, em Faro Capital, Junqueira Rodas e Kronos, respectivamente. A parte comercial permaneceu conjunta e mantém mais da metade da Montecitrus, que foi formada em 1983, ano de nascimento da Sarita.
Atualmente, o Grupo Junqueira Rodas trabalha com citros, cana e gado e tem 518 funcionários, além de safristas. Nos últimos anos, o grupo fez a renovação de 100% da área citrícola, dobrando o número de plantas – de 1 milhão para 2 milhões – e também dobrou a produção de cana.
Para dar segmento à administração do seu pai, Sarita conta com o apoio da mãe e da irmã Renata, responsável por cuidar da família. “Ela me proporciona ser a mulher empreendedora que sou hoje”, diz emocionada. “O legado do meu pai será tocado por nós sempre, como uma dupla que dá resultado. Eu nos negócios e ela na família. ”
Gestão feminina
Para a citricultora, a gestão da mulher é mais focada nos recursos humanos. "O grande diferencial está na valorização das pessoas. Eu não seria nada sem minha equipe. Assumi esse negócio precocemente e estou em um constante aprendizado. Nossos colaboradores em algumas situações têm palavra mais forte do que a minha. Hierarquicamente tem o organograma, mas tecnicamente tem o conhecimento superior e isso sempre foi muito respeitado aqui. Valorizo as pessoas que trabalham comigo. Acredito tanto nelas que um dos meus primeiros projetos foi a contratação de coaching em um trabalho com gerentes, comigo e com o diretor agrícola, Marcelo Carminatti, e que agora continua com os gerentes de fazenda e os engenheiros agrônomos", afirma.
Mesmo com o olhar mais voltado para os funcionários, Sarita não abriu mão de investir em melhorias de processos. "A empresa vinha crescendo comandada por um empreendedor nato. Com a ausência do meu pai e a mudança para vários sócios, a primeira coisa que a gente implantou foi uma controladoria muito forte. Depois, o projeto de orçamentos, indicadores e o último de metas, com o sistema de meritocracia e gestão de resultados", conta.
Questionada sobre as dificuldades de ser mulher em uma atividade predominantemente masculina, Sarita prefere falar das conquistas. “Eu trago graça aos lugares, tiro os palavrões, está ficando mais educado", brinca. "A mulher à frente dos negócios pratica o convencimento, motiva as pessoas para que elas vão aderindo aos projetos e não os impõe de cima para baixo. Além disso, o jeitinho feminino encanta as pessoas e isso ajuda nos negócios, a gente não vai para um enfrentamento, parte para o convencimento”, diz.
Missão de ser mulher
Considerada uma área masculina, o agronegócio vem, aos poucos, se rendendo às mulheres, mas o processo é bem lento. Segundo o último censo agropecuário do IBGE, de 2006, apenas uma em cada 10 das pessoas que trabalham no agronegócio é mulher.
"Eu tenho que administrar a curiosidade das pessoas. Quando eu chego nos lugares tenho que explicar quem eu sou, porque estou à frente dos negócios. A pergunta “por que não é meu irmão” eu ouço todo dia. Primeiro, eu não tenho irmão. Segundo, mesmo que eu tivesse e eu fosse mais preparada do que ele teria que ser ele? Para o mundo do agronegócio, teria. Você tem que dar muitas explicações por ser uma mulher. Eu não gosto de chamar de preconceito, porque preconceito é quando você é menosprezado ou maltratado e eu não sou, então eu prefiro falar em curiosidade”, diz.
"A dedicação da mulher tem que ser muito mais intensa, ela tem que provar 24 horas do dia, sofre alguns acessos desnecessários trabalhando no mundo masculino, a gente enfrenta dificuldades que os homens não enfrentam e não têm as portas abertas que eles têm", afirma.
Como precursora na sua área, Sarita já enfrentou muitos obstáculos, mas isso não a impede de continuar a abrir fronteiras.
“Eu acredito que qualquer pessoa na minha situação, jovem, que nunca tinha trabalhado, que perdeu o pai tão precocemente, assumiu um negócio tão grande, teria dificuldade sendo homem ou mulher. Não atribuo as dificuldades ao mundo feminino, só que elas são agravadas por eu ser mulher. Além do legado que o meu pai deixou, que é a maior missão que move a minha vida, eu tenho uma missão junto a um grupo de mulheres, que hoje no agronegócio é bem pequeno, de abrir as fronteiras para as próximas gerações, porque eu acredito muito na igualdade feminina. Eu não quero privilégios, só quero ganhar igual aos homens e ter ascensão de trabalho igual a eles. No agronegócio ainda existe um pouco da ideia de força bruta, então existe um pouco de dificuldade de entender que a mulher pode dar conta de gerir um negócio agrícola. Eu não acredito que o campo precisa de brutalidade, o campo é uma empresa como qualquer outra e precisa é de gestão e as mulheres têm toda condição de fazer isso", afirma.
A falta de brutalidade das mulheres gera bons resultados, segundo Sarita. Ela cita o exemplo da única tratorista da empresa que é reconhecida pelo cuidado com o equipamento, que tem menos manutenção. Outra função que o trabalho feminino se destaca no Grupo Junqueira Rodas é a inspeção de pragas, que é feito exclusivamente por mulheres, devido à atenção dedicada por elas.
"Eu acho que a minha missão é quebrar paradigmas, e mostrar para o mundo que a sucessão no agronegócio não precisa ser feita pelo filho homem. Eu tenho uma missão muito grande que é a de suceder meu pai – que foi uma pessoa muito empreendedora, muito brilhante, muito competente – não sendo homem. Eu acordo todos os dias com essa determinação. São agressivas as dificuldades que a gente enfrenta, mas tem que ter muita persistência. Eu entendo quando muitas desistem. Passam para irmão, para o marido porque é bastante desgastante, todo dia ter que provar que é capaz. Está no meu propósito de vida abrir essas fronteiras, esses caminhos, mostrar que a gente é capaz, que a gente é respeitada, que se respeita e quer respeito", afirma.
Amor pela laranja
Segundo Sarita, o futuro do Grupo Junqueira Rodas é o mesmo da sua origem: a laranja.
"Eu nasci com a laranja. A fundação da empresa foi no ano em que eu nasci. Tudo o que eu vi o meu pai ter na vida veio da laranja. Nossa vida é a citricultura. A citricultura é um amor que dá dinheiro. A gente tem que implantar gestão de resultados porque as margens são muito apertadas, mas o que nos move é outra coisa. Tem que ter muito amor porque é além de qualquer indicador e de qualquer panorama, não se explica em números. Enquanto eu estiver à frente dos negócios, os projetos do Junqueira Rodas são crescer na laranja. Se a gente compra uma nova propriedade ou arrenda para o gado, por exemplo, pensa se ela tem água porque vai poder ser de laranja. Tudo o que a gente faz tem o olhar de que se no momento não é citrícola, pode se tornar amanhã", afirma.